segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Inveja

Tempos de assumir pecados e defeitos. Um deles é a inveja, ainda que quase sempre ligada à arte, nunca a coisas materiais. Invejo Ruy Guerra pelo texto abaixo, que eu gostaria muito de ter escrito. Assumo e publico:

Sabe, no fundo eu sou um sentimental.
Todos nós herdamos no sangue lusitano uma boa dosagem de lirismo ( além da sífilis, é claro). Mesmo quando as minhas mãos estão ocupadas em torturar, esganar, trucidar, o meu coração fecha os olhos e sinceramente chora...

Meu coração tem um sereno jeito
E as minhas mãos o golpe duro e presto,
De tal maneira que, depois de feito,
Desencontrado, eu mesmo me contesto.

Se trago as mãos distantes do meu peito
É que há distância entre intenção e gesto
E se o meu coração nas mãos estreito,
Me assombra a súbita impressão de incesto.

Quando me encontro no calor da luta
Ostento a aguda empunhadora à proa,
Mas meu peito se desabotoa.

E se a sentença se anuncia bruta
Mais que depressa a mão cega executa,
Pois que senão o coração perdoa.

Ruy Guerra


Postado por Zé Mauro Nogueira, um invejoso




3 comentários:

  1. Se serve de consolo, há quem sinta inveja e vontade de ter escrito alguns de seus escritos...parabéns!

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    1. Tem dias que a alma precisa de um afago, hoje é um deles. Muito obrigado, seja você quem for.

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