quinta-feira, 26 de novembro de 2009

O fim das certezas

Um dos primeiros filmes que assisti no cinema foi Star Wars, o primeiro, sei lá em que ano. Só lembro que fui levado por meu pai, de surpresa, e fomos ao antigo Cinema Nazaré, em Belém do Pará. De lá para cá, já fizeram trilogias e hexalogias dessa história, mas o que me importa aqui é o conceito filosófico por trás da ação: a luta entre o bem e o mal. 

 Em Guerra nas Estrelas a “força” está dividida em dois lados muito nítidos, o negro e o claro, ou seja, o lado mau e o lado bom. Luke Skywalker é o bonzinho e Darth Vader é o vilão, um vestido de branco e o outro de preto. Tudo muito simples, maniqueísta. 

 Nessa época antiga em que eu cresci, as coisas eram assim mesmo, bem definidas, fáceis de entender e de tomar partido. Na política havia ARENA e MDB, direita e esquerda, progressista e reacionário. Para alguns, o inimigo eram os russos, comunistas, para outros eram os americanos, imperialistas. 

Nas relações pessoais, havia as pessoas de quem gostávamos e aquelas de quem não gostávamos, sem complicações, como também não era complicado dividir todos entre honestos e desonestos. No colégio, todos sabiam quem era inteligente e quem era "burro", quem sabia jogar bola e quem era pereba, quem fazia bagunça e quem era CDF, quem era para namorar e quem era galinha, quem era macho e quem era bicha. Não sei com o que sonhávamos exatamente. Eu mesmo, olhando para trás, parece que só me importava em jogar bola e conseguir mulher, nada mais profundo que isso, e no meio tempo, estudava um pouquinho. 

Podíamos escolher entre quatro marcas de carro apenas e todo mundo sabia que Fiat não prestava, Volkswagen era duro e Ford era confortável mas quebrava fácil. Chevrolet, para ser franco, nunca me disse nada. Hoje tudo mudou. Não sabemos mais de nada. Pelo menos eu não sei. Temos tantas marcas e modelos de carro que não posso distinguir um do outro sem ler o nome na traseira. 

Os caras que eram os mocinhos, pelos quais fomos às ruas com bandeiras vermelhas e orgulhosas estrelas no peito, hoje são tão bandidos quanto os outros. As mulheres não são mais óbvias como eram e não se pode mais classificá-las em "para casar" e "galinhas", o que, apesar de vergonhosamente machista, facilitava muito as coisas. 

 Não podemos, em ambiente de trabalho, simplesmente escolher de quem gostamos ou não. Temos de ser "emocionalmente inteligentes", ou seja, ter um saco do tamanho do mundo para não mandar "aquele filho da puta" tomar no olho do cu. Ah, como era bom mandar alguém tomar no "olho do cu", era muito mais enfático e fazia um bem danado. 

No futebol, o drible agora é "firula", o cara que pensa um pouco é "lento" e nem dá mais, sequer, para dizer que existe time grande, afinal, o Avaí está na primeira divisão e o Fluminense à beira da segunda.

Não se sabe mais quem é bicha ou quem é apenas metrosexual. Aliás, como diz o Jabour, ser homossexual era vergonha, passou a ser tolerado e agora está virando moda. E precisamos, no mínimo, não ter preconceito. Os caras da "esquerda" agora roubam e os da "direita" clamam por ética e honestidade. Não sei, não, virou tudo de pernas para o ar. É como se um terremoto tivesse nos atingido e quebrado tudo, sobretudo nossas certezas. 

Será que vamos nos acertar neste mundo atual, onde tudo "depende" e nada pode ser afirmado ou defendido com o mínimo de certeza? Não sei mesmo. Pode ser que eu esteja sendo apenas pessimista, como sempre fui. Tomara. E tomara ainda mais que apenas eu esteja duvidando de tudo. 

Mas, se eu estiver certo, é bom guardar ao menos uma certeza dos bons e velhos tempos: o valor da amizade e dos afetos sinceros! 


 Zé Mauro Nogueira

3 comentários:

  1. Mas escreve bem que só. Vou passar sempre por aqui e indicar!!! =D

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  2. Esse mundo parece mesmo desajustado. Uma olhada rápida nos jornais e você percebe isso.

    Às vezes, parece-me que esse período de incertezas prenuncia a vinda de algo maior. Sei lá! Não lhe parece que estamos vivendo uma fase de transição?

    Não podemos esquecer que toda a prosperidade cultural do Iluminismo foi uma resposta ao osbcurantismo da Idade Média. É disso que estou falando.

    Talvez estejamos prestes a vivenciar algum tipo de experiência significativa (não, não é do 2012 que estou falando!), algo que seja uma resposta a este 'rebuceteio' que se tornou a vida moderna. Pode ser até uma volta ao simplismo de tua infância. Quem pode saber?

    "Pode ser que eu esteja sendo apenas pessimista, como sempre fui". O pessimismo, já diz o poeta, é qualidade de todo livre-pensador. Grande texto.

    Abraço!

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  3. É, DoGMA, tenho a mesma impressão que você, uma ruptura parece a caminho. Valeu!
    ZM

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